Sobre “Maria e os Insetos”
A coisa que eu mais gosto sobre Maria e os Insetos é que eu não conseguiria dirigir um espetáculo assim. Sério mesmo.
Não sei se vocês passam por isso também, mas sempre que eu vou com meus amigos ao teatro, volta e meia a gente se pega falando “ah, e se naquela cena fosse assim?” ou “nossa, se eu fosse dirigir, eu faria assim, assim e assado”. Não é um exercício de ser cuzao e pensar “ah, eu faria melhor” (palavra de escoteiro!) mas mais um exercício de imaginação de como nós nos viraríamos com tal texto ou tais escolhas.
E isso nos traz a Maria e os Insetos. Eu não faço a menor ideia de como eu faria um espetáculo infantil sobre uma naturalista e ilustradora alemã do século XVII e XVIII. Ou melhor, eu conseguiria fazer um espetáculo sobre ela. Agora, um bom espetáculo, aí é outro rolê.
E Maria e os Insetos é um puta espetáculo.
Primeiro, é louvável a investigação atual da Cia Delas em levar aos palcos as vidas e feitos de mulheres que revolucionaram a ciência; segundo que é animal elas conseguirem falar disso sem didatismo, pedantismo e com uma linguagem palatável para diversas plateias.
Mais do que um biografia sobre Maria Sybilla Merian, a naturologista e ilustradora alemã que revolucionou seus campos de estudo na Europa dos séculos XVII e XVIII, Maria e os Insetos é um elogio à imaginação, ao espírito investigativo e à insubmissão.
Maria e os Insetos não só fala daquela Maria e daqueles insetos, mas também das outras Marias, de antes e de agora, que têm potencial para ver mais do que a sociedade nas qual estão inseridas pode ver. Fala sobre a mulher e a ciência (alô, Brasil de 2020!) e sobre a humanidade e sua relação de igualdade com a natureza (alô, humanidade de 2020!). E também fala do poder da imaginação, da curiosidade e das artes — e isso vale para as gravuras e aquarelas científicas e para o teatro. Fala da arte como construção de conhecimento e catalizador de novas possibilidades de mundo e de sensibilidade.
Em mãos menos sensíveis, Maria e os Insetos tinha tudo pra ser uma biografia quadradona e genérica dessas que parecem telefilme ruim de baixo orçamento do catálogo dos canais mais ruinzinhos da tv por assinatura ou do streaming. Mas a equipe responsável pela criação do espetáculo é hábil o bastante para causar na plateia a mesma sensação de deslumbramento e encanto que a Maria original teria olhando os insetos. Para isso, diversos efeitos simples, mas muito eficazes, são utilizados: uma projeção que emula um microscópio; um flipbook de uma borboleta voando; um painel imenso, ao final do espetáculo, que redimensiona a escala (como o mundo é grande, e maravilhoso, e ameaçador e como perante ele nós também somos insetos!) etc. Todo esse repertório ajuda a concretizar a dramaturgia e a manter um senso de descoberta constante.
O mesmo vale pro elenco, que se desdobra entre narradoras e diversos personagens que gravitam ao redor de Maria. Se, as vezes, (principalmente no começo, até você se habituar ao jogo) é meio difícil de entender quem é quem, quando o efeito dá certo ele dá bastante certo — a cena do jantar em família e com a Berta e seus velhos truques me fez rir bem mais alto do que eu deveria.
Levar a vida de Maria Sybilla Merian pros palcos realmente parece um puta desafio. E Maria e os Insetos me lembrou que existe espaço para a poesia e o deslumbramento em praticamente todas as coisas, é só estar atento para percebê-las.
Maria e os Insetos. Foto: Lígia Jardim
MARIA E OS INSETOS
Direção: Thaís Medeiros
Dramaturgia Original: Fernanda Castello Branco, Julia Ianina, Paula Weinfeld e Thaís Medeiros
Elenco: Fernanda Castello Branco, Julia Ianina e Paula Weinfeld
Direção de Arte: Mira Haar
Iluminação: Wagner Freire
Trilha Sonora Original e Sonoplastia: Arthur Decloedt
Gravações de Campo: Projeto Sonora – MIHNA (Museu Imaginário de História Natural da Amazônia)
Preparação Corporal: Mauricio Flórez
Consultora de Biologia: Profa. Me. Elaine Machado
Vídeo Metamorfose: Cia. Pavio de Abajour
Aderecista: Carlos Rebecca
Flipbook: Victor Merseguel
Animação Imagens Flipbook: André Catoto
Modelagem e Costura: Ateliê Judite de Lima
Chapéus: Juliano Lopes
Pintura Piso e Cavaletes: Fabin Cenografia
Design Painel e Material Gráfico: Lorota
Design Reproduções e Estudos: Theo Haar de Souza
Cenotécnico: Mateus Fiorentino Nanci
Contra-regra: Jean Marcel Silva
Assistente de Iluminação: Alessandra Marques
Operação de Luz: Sylvie Laila
Vozes: Carlos Moreno, Luiza Lian e Mira Haar
Operação de Som: Samuel Gambini
Assessoria de Imprensa e Redes Sociais: Pombo Correio
Fotografia e Vídeo Metamorfose: Ligia Jardim
Apoio Institucional: Goethe-Institut
Produção Executiva: Cecília Magalhães
Idealização e Produção Geral: Companhia Delas de Teatro